Dissertação de Mestrado - Ensaias

INTRODUÇÃO

Pesquiso ou persigo saias.

“Agora, ao som do fabuloso artífice, ele parecia ouvir o barulho das ondas escuras e ver uma forma alada voando por sobre as ondas e se elevando lentamente no espaço.”

O vôo de Dedalus por sobre o mar rumo ao sol. Do insondável da existência se ergue uma forma alada.

A primeira imagem, indelével.

Saia azul suspensa no terreiro, recordação. Ganhava vida fugaz através de uma brisa. Bailava pelo ar que a sustentava acima do solo. A cada sopro, a saia no varal infla parecendo reviver um corpo que falta. Incorpora sua antiga dona, uma velha negra. O pedaço de tecido ao vento era a presença dela, da avó, morta há pouco tempo. Lembrança diante da qual meus olhos despertaram para um ato de performance.

A saia azul que jazia sem um corpo era animada novamente. Ela estava viva ao vento ou em outros corpos. Mulheres familiares costumavam vestir a saia. A semelhança com a avó fazia com que a presença dela persistisse no corpo dessas outras mulheres. A saia de uso comum era uma espécie de entidade.

As vestes, os objetos, os lugares, todas as coisas são entes (seienden) dotados de um ser (sein), Heidegger (1979). O ser-aí (dassein) pode conferir significado e vida às coisas? A saia azul lentamente se eleva. É a lembrança impalpável. Vida renovada na dança das mulheres de saias. Performance dos corpos coletivos entorno do ente. O significado de performance pode estar atrelado à ação do corpo coletivo ou à de um ente.

Mulheres usando saias. Herança. Um gesto repetido por gerações. Em saias sente-se o ar por entre as coxas. Nada impede o movimento. “Maria sunga a saia, chuva évem pra te molhá.” Maria empreende a dança libertária. Ela sobe as saias até as coxas e sobe o morro em meio à torrente. A água corre por entre as pernas, a vida se realiza...

Nenhum comentário: